À ordem

Ernani Spagnuolo

Advogado, Cientista Jurídico, Político e Social. Instagram: @uadvogado

Não existe justiça no Brasil

Ainda que não tenha vivido tanto quanto alguns, mas já mais que outros, é inevitável que, no decorrer de nossas experiências cotidianas, contatos interpessoais e do que consumimos e absorvemos, criemos conceitos sobre quase tudo.


Ao observar o cotidiano, em meio ao ruído de informações e à proliferação de “especialistas” em redes sociais que não têm experiências sobre o que falam – mas parecem ter – percebemos que estamos cada vez mais voltados para o egoísmo.


A época dos mestres, daqueles que aprendem antes de ensinar, parece estar chegando ao fim.


Com o excesso de informações e a exaltação do egocentrismo, há mais pessoas tentando ensinar, muitas vezes sobre o que não sabem, do que buscando aprender.


A justiça, em sua essência, é concebida como “a virtude moral que rege o ser espiritual no combate ao egoísmo biológico, orgânico, do indivíduo” (ADEODATO, 1996).


Sua função deveria ser harmonizar os conflitos cotidianos, trazendo paz tanto aos indivíduos quanto à sociedade. No entanto, se toda decisão deixa alguém insatisfeito, será que ainda podemos falar em justiça?


Platão, segundo a síntese de Michael J Sanders, afirmava que, para avaliar a justiça de uma sociedade, é necessário analisar como ela distribui aquilo que valoriza: riqueza, cargo e honrarias; e se essa distribuição oferece a cada indivíduo o que lhe é devido.


Se essa lógica fosse seguida, cada cidadão deveria sentir-se realizado, seja na felicidade com suas atividades diárias, seja na satisfação com seu trabalho. Mas não é isso que vemos.


Tudo parece um grande engodo. Enxergamos e não vemos.


Só observamos.


Juridicamente, as interpretações são divergentes.


Socialmente, há quase 8 bilhões de julgamentos individuais.


No fim, a justiça parece ser, realmente, o poder do mais forte: aquele que ocupa cargos cria leis conforme seus próprios interesses, decide de acordo com suas vontades e pune quem discorda.


Assim como Criolo canta “não existe amor em SP”, podemos cantar que “não existe justiça no Brasil”.


Toda vez que uma parte vence, outra perde. E para quem perde, perder já é injusto por si só.


Diante de uma insatisfação generalizada, precisamos repensar a aplicação da justiça.


Talvez estejamos caminhando para um futuro em que os algoritmos de inteligência artificial assumam a tarefa de decidir nossos conflitos cotidianos. Um sistema imparcial, livre de preconceitos e preconcepções humanas, poderia aplicar a justiça com verdadeira neutralidade.


Mas isso levanta outra questão: uma decisão impessoal, desprovida da subjetividade e dos sentimentos de quem viveu experiências humanas, poderia ser considerada justa?


Ainda que pareça uma alternativa promissora, há um abismo ético a ser enfrentado antes de entregarmos nossos valores mais preciosos a máquinas.


O tempo muda, como sempre mudou. No Brasil, essa transformação ocorre de forma tão acelerada e desordenada que os cidadãos se sentem perdidos, inclinados a repetir ideias alheias em vez de formar suas próprias opiniões.


Entretanto, talvez nunca haja justiça perfeita enquanto o ser humano for humano.


Devemos, portanto, nos contentar com a aplicação das leis, que inevitavelmente deixarão alguém insatisfeito. Afinal, a estrutura judiciária aparentemente parece existir para perpetuar o poder de quem já o detém.


Ainda assim, é preciso ter esperança. Existem homens justos, mesmo que os injustos sejam mais populares. E talvez a verdadeira justiça comece em um compromisso simples: sermos justos conosco e, em seguida, com o próximo.

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